O PAPEL DA MULHER NA HISTÓRIA DO CRISTIANISMO
Marilda Coelho da Silva[1]
RESUMO
Este artigo propõe analisar o papel da mulher na história do Cristianismo;
enfoca quais as imagens da mesma são projetadas pelo discurso da Igreja a luz
da Bíblia Sagrada e as consequências morais e sociais que delas podem ser
apresentadas. A participação da mulher na história do Cristianismo é um fato
inquestionável. No entanto, como na sociedade civil, a mulher herdou o
estereótipo de ser destinada unicamente “à procriação e aos trabalhos
domésticos”. Com isso, sua participação na vida eclesial, por muito tempo, foi
negada, apesar de que, a visão feminina do Novo Testamento sempre existiu, mas
o estudo sistematizado com vistas às revisões do papel da mulher na história do
Cristianismo é mais recente. Se analisarmos corretamente os textos bíblicos em
relação às mulheres, veremos que o Cristianismo dá à mulher o
respeito e o lugar de destaque que ela merece.
Resgatar a atuação de agentes femininos
nos traz a possibilidade de compreender mais ainda a história de homens e
mulheres que atuaram em um movimento fecundo, como a história do Cristianismo.
Palavras - chave: Mulher. Participação. Cristianismo.
ABSTRACT
This article proposes
to analyse the role of women in the history of Christianity; focuses on which
images are projected by the discourse of the Church the light of the Holy Bible
and the moral and social consequences which may be submitted. The participation
of women in the history of Christianity is an unquestionable fact. However, as
in civil society, the woman inherited the stereotype of being designed solely
"to the procreation and the housework". With this, its participation
in ecclesial life, for a long time, was denied, though, the feminine vision of
the New Testament has always existed, but the study systematized with views to
the revisions of the role of women in the history of Christianity is more
recent. If we analyze correctly the biblical texts in relation to women, we see
that Christianity gives the woman the respect and the prominent place that it
deserves. Rescue the female agents acting brings us the possibility to
understand the history of men and women who acted in a move fruitful, as the
history of Christianity.
Keywords: Woman.
Participation. Christianity
INTRODUÇÃO
Este
artigo analisa o papel da mulher na História do Cristianismo, para tanto,
tomou-se como texto base para análise documental a Bíblia Sagrada[2]. Na Bíblia pode-se observar que muitas
mensagens de Cristo, incluem a mulher em seu ministério terreno. Embora
esteja claro na palavra que Deus não formou a mulher para ocupar cargos de
liderança, ou posição de autoridade sobre o homem, também está claro que a
mulher foi firmada como uma companheira idônea e sábia, aquela que está diante
do marido para assisti-lo e completá-lo, dando-lhe condições de tomar decisões
sábias.
Quando
se discute sobre o papel da mulher na história do Cristianismo, especialmente a
luz do Velho Testamento, o debate se torna polêmico. Muitos consideram a bíblia
como um livro, cujo conteúdo é machista. Segundo esta linha de pensamentos a
mulher é colocada à margem de tudo no relato bíblico. Todavia, o que se
evidencia no contexto histórico da antiguidade, no qual se desenvolveu o relato
do Velho Testamento, é o fator cultural daquela época onde os costumes e as
práticas de vida determinavam o meio com sua vivência social. Portanto, a
cultura de uma época influenciou a muitas gerações, e até o contexto atual,
muitos ainda negam a participação da mulher na história do Cristianismo.
No decorrer da história do Cristianismo,
observa-se que a mulher vem de muitas lutas e conquistas, a qual com o passar
do tempo ganhou espaço e respeito e conquistou lugar no mundo pela sua
capacidade de comover, administrar e sensibilizar a sociedade.
Analisando o relato bíblico é possível
perceber que a mulher ganha espaço, como algo essencial na criação. Sem a
presença da mesma, a criação seria incompleta e o homem estaria solitário e sem
procriação. Dessa forma, a mulher é parte integrante da criação da história e
da sociedade. Homem e mulher são dependentes um do outro para a perpetuação da
raça humana. Neste sentido, a mulher exerce seu papel na história como
instrumento de Deus agindo na dispensação da graça, ativa e direta no propósito
de Deus.
A MULHER NA HISTÓRIA DO CRISTIANISMO
Analisando a
participação da mulher na história do Cristianismo[3], vamos inicialmente ao
encontro das sociedades de cultura de coleta e caça, nas quais, segundo Muraro
(1993), as mulheres tinham um papel central, em muitos casos vistas como
sagradas graças a sua capacidade de poder dar a vida e ajudar na fertilidade da
terra e dos animais. Nestas sociedades a força física não era uma necessidade.
Desta forma, a mulher possuía um lugar central. Somente nas sociedades em que a
coleta e a caça de pequenos animais se tornavam escassa instaura-se a supremacia
masculina, visto que antes masculino e feminino governavam o mundo
harmoniosamente.
Quando
se fala em desenvolvimento humano, seja nos aspectos econômicos, sociais e
políticos, percebe-se que em qualquer situação, o cerne insurge e clama pelas
mulheres. São elas que cuidam da educação, saúde, maternidade, pobreza ou
riqueza. Em todos estes aspectos, as mulheres estão presentes, sofrendo as
consequências ou promovendo soluções. A
mulher coloca a serviço da humanidade seu potencial de reconciliação, sua
presença solidária e afetiva, sensível e dinâmica, sua capacidade especial de
amar, de perdoar e sempre retomar a vida com coragem e esperança. Neste contexto, na
questão religiosa não é diferente: a mulher desempenhou e desempenha importante
papel na história do Cristianismo.
Apesar
de tantas descobertas que se tem alcançado até hoje, origem da vida é um
mistério no qual homem e mulher deve a sua vida. A inferioridade da mulher é
algo deturpado e degenerado. No plano da criação homem e mulher são sócios no
aspecto biológico sexual, social, moral e espiritual. A diferença estabelecida
por Deus entre o homem e mulher, está na atribuição de responsabilidade. O
homem possui uma hierarquia de compromissos. Neste sentido, é o homem que tem,
principalmente, que responder a voz de Deus. Entretanto, a mulher também tem
logo em seguida a mesma responsabilidade. Deus fala com a mulher e exige
respostas (GÊNESES 3: 13).
Na própria vida da Igreja, como
demonstra a história, houve mulheres que tiveram um papel decisivo e
desempenharam tarefas de valor considerável. Basta pensar-se nas fundadoras das
grandes Famílias religiosas, como por exemplo, Santa Clara e Santa Teresa de
Ávila. Esta última, depois, e Santa Catarina de Sena deixaram escritos tão
ricos de doutrina espiritual, que o Santo Padre Paulo VI as inscreveu entre os Doutores
da Igreja. E não se pode esquecer, ainda, o grande número de mulheres que se
consagraram ao Senhor para prática das obras de caridade ou para o trabalho nas
missões, e também o grande número daquelas que, como esposas cristãs, tiveram
uma influência profunda na própria família e em particular no transmitir a fé
aos seus filhos.
Mata (2010, p. 116), lembra que no
Cristianismo primitivo as mulheres tiveram uma participação relativamente
ativa: “contavam-se mulheres entre os primeiros seguidores de Jesus. algumas,
notadamente em Corinto, exerceram um papel de liderança. Ao que tudo indica,
sua autoridade adveio da posse de dons carismáticos como a profecia e a
glossolalia[4]”.
De acordo com Stanley (1998), a igreja
tanto nomeou diaconisas como diáconos para atuarem no desenvolvimento de
cerimônias cristãs religiosas. Essas mulheres ministravam a outras mulheres de
várias maneiras, tal como o ensino de catecúmenas, ajudando no batismo feminino
e acolhendo outras mulheres nos cultos da igreja; serviam também como
mediadoras entre os membros da igreja e cuidavam das necessidades físicas, emocionais e
espirituais dos encarcerados e dos perseguidos.
A arte cristã do primeiro e segundo século descreve mulheres
desempenhando várias atividades espirituais – administrando a Ceia do Senhor,
ensinando, batizando, cuidando das necessidades físicas da congregação e
liderando as orações públicas (STANLEY, 1998, p. 42).
Encontram-se nos Evangelhos mulheres que brilharam na história de
Jesus Cristo: profetizas, mártires, diaconisas, virgens, renunciantes,
monjas, enfim, grupos heterogêneos. Por exemplo, as duas figuras femininas que
se destacam em relação a Jesus foram: Maria, mãe dele e, Maria Madalena, ambas
tiveram destaque dentre tantas outras figuras femininas que alimentarão a
piedade mariana, sustentarão o ideal de virgindade, e constituirão as imagens
femininas para a futura iconografia cristã.
Outra mulher de importante referência na Bíblia Sagrada foi Miriã, ela é citada na história do
Cristianismo como profetisa, como aquela que liderou as mulheres israelitas em
canções e danças de louvor. Com essa afirmação, pode-se percebe-se que Miriã
desempenhou um papel de liderança entre as mulheres de Israel, colocando-a em
destaque em relação ao papel exercido pelos homens daquela época: “a profetisa Miriã, irmã de Arão, tomou um tamborim, e todas as
mulheres saíram atrás dela com tamborins e com danças” (ÊXODO 15: 20, 21).
Ainda sobre a posição de Miriã, como
líder de Israel, essa é indiscutível. De fato, ela era tão proeminente que um
profeta posterior, Miqueias, mencionou-a: “Eu os tirei do Egito, salvando-os da escravidão, e enviei Moisés,
Arão e Miriã para os guiar pelo deserto”; “pois te fiz subir da terra do Egito, e da casa da servidão te
remi; e enviei adiante de ti a Moisés, Arão e Miriã” (MIQUEIAS 6: 4).
A expressão bíblica (GÊNESES 1: 24) que
destaca: “e serão ambos uma só carne”. Disto isto, percebe-se que não há
nenhuma afirmação ou ordem colocando o homem em posição superior a mulher na
história da criação. Nesta ótica, no propósito de Deus não existe predominância
masculina e nem subordinação feminina. Demonstra-se que não há inferioridade
entre homem e mulher, há uma celebração de unidade e igualdade.
A Bíblia raramente se refere às mulheres cristãs sem falar sobre
suas boas obras (1 TIMÓTEO, 2: 9-10; 5: 10). No
Novo Testamento, encontra-se as quatro filhas de Felipe que “profetizavam”,
isto é, falavam em público. Em Romanos (16. 7), nos deparamos com o nome de
Júnia, com certeza uma mulher, entre os apóstolos. Também
tinha Dorcas, que praticava ações contínuas de bondade e caridade (ATOS, 9:
36-39); uma Maria que "muito trabalhou por vós" (ROMANOS, 16: 6); as filhas de Filipe profetizaram (ATOS 21: 8,9) e Febe que servia à igreja de Cencréia e socorreu a muitos
(ROMANOS, 16: 1-2). Lá se encontram exemplos de várias mulheres, como: Maria,
irmã de Marta e de Lázaro, que ungiu o corpo de Jesus para seu sepultamento (MARCOS,
14: 3-9).
Estando ele em Betânia, reclinado à mesa, em casa de Simão, o
leproso, veio uma mulher trazendo um vaso de alabastro com preciosíssimo
perfume de nardo puro; e quebrando o alabastro, derramou o bálsamo sobre a
cabeça de Jesus. Indignaram-se alguns entre si e diziam: Para que este
desperdício de bálsamo? Porque este perfume poderia ser vendido por mais de
trezentos denários e dar-se aos pobres. E murmuravam contra ela. Mas Jesus
disse: Deixai-a; por que a molestais? Ela praticou boa ação para comigo. Porque
os pobres, sempre os tendes convosco e quando quiserdes, podeis fazer-lhes bem,
mas a mim nem sempre me tendes. Ela fez o que pôde: antecipou-se a ungir-me
para a sepultura. Em verdade vos digo: onde for pregado em todo o mundo o
evangelho será também contado o que ela fez para memória sua (MARCOS,
14: 3-9).
No Novo Testamento as mulheres
também serviam como professoras. Pode-se observar como um exemplo importante à
referência a Priscila, em quatro das seis referências a esta mulher casada,
Paulo e Lucas quebram a regra usual, mencionando Priscila antes do marido - um
judeu por nome Áquila, natural do Ponto (ATOS 18: 18,
26; ROMANOS 16: 3; II TIMÓTEO, 4: 19).
Percebe-se o papel de Priscila como
professora, nitidamente, na narrativa da visita de Apolo a Éfeso. “Ele começou a falar ousadamente na sinagoga: mas quando Priscila
e Áquila o ouviram, levaram-no consigo e lhe expuseram com mais precisão o
caminho de Deus” (ATOS 18: 18-28). O texto de Atos nos dar uma
indicação clara do ensino feito com autoridade por uma mulher da Igreja.
Pedro
mostra que as mulheres devem dar mais importância ao caráter interior e menos à
aparência externa (1 Pedro 3: 1-6). Tanto os homens quanto as mulheres devem
ser o sal da terra e a luz do mundo (MATEUS, 5: 13-16). Enfim, mulheres e
homens são iguais diante de Deus e ambos têm maneiras importantes pelas quais
devem servir a Deus (GÁLATAS, 3: 28).
Analisando a história de Débora é possível perceber uma aplicação
importante da liderança. Débora
foi a líder feminina mais proeminente dos primeiros tempos de Israel – ela
serviu como a líder principal sobre o povo. É apresentada
como uma juíza usada por Deus para libertar seu povo. A posição que ocupava combinou o trabalho de
profeta e juíza. Os juízes funcionaram como o mais elevado tribunal de justiça
de Israel (Deut. 17:8-13). No desempenho dessa função, Débora assumiu o papel
de juiz nacional, quase da mesma forma como aconteceu com Moisés (ÊXODO, 18:
13).
Débora teve como
papel primário o de profeta, que poderia ser parte da função de alguém chamado
para liderar; contudo, um "líder" normalmente desempenha tal papel e
muito mais. Por definição, um profeta é um porta-voz de Deus. Por via de
contraste, um sacerdote traz orações, ofertas, sacrifícios e preocupações das pessoas
a Deus.
Nesse sentido, o
papel principal de Débora era reunir as tropas e colocá-las na direção desejada
por Deus. Ou seja, sua missão iguala-se à tarefa principal do pastor, nos dias
de hoje. Os pastores têm de ter coragem para discernirem a palavra de Deus no
contexto da igreja para a qual Deus chamou-os; além disso, devem reunir as
pessoas, apontá-las na mesma direção e enviá-las com coragem e ousadia neste
mundo agonizante, para levar Cristo a todos que, desesperadamente, precisam
dele.
Portanto, a participação de Débora, como profetisa e
juíza, não era uma “pequena indústria” particular, praticada na sua casa, pelo
contrário, não existem quaisquer dúvidas de que Débora era a líder/juíza
reconhecida e nomeada pelos israelitas da época. Esse exemplo de Débora
confirma que nem Deus nem os hebreus da Antiguidade consideravam a liderança
feminina intrinsecamente inferior a masculina.
Para Mata (2010), o catolicismo
destaca com preeminência a participação da mulher em cerimônias religiosas.
A bem da verdade, o domínio masculino nunca é absoluto. O
catolicismo popular se caracteriza, entre outras cosas, por uma certa
preeminência feminina na práxis religiosa cotidiana. Em grupos de oração, na
prática da reza do terço, na preparação e condução das cerimônias fúnebres, a
mulher adquire recolhimentos da América portuguesa – marcados por essa
impressionante corrente de espiritualidade que foi a devotio moderna -, a
mística feminina adquiriu uma importância inegável. Há quem fale numa
verdadeira feminização do misticismo ibérico ao longo do século XVI (p.
116-117).
O papel da
mulher na história do Cristianismo é evidente desde o período que inicia a
criação do mundo, como nos mostra a Bíblia (GÊNESIS, 3-16). Deus disse também à
mulher: “multiplicarei os sofrimentos de teu parto; darás à luz com dor teus
filhos; teus desejos te impelirão para o teu marido e tu estarás sob o seu
domínio”.
Na Encíclica da
Dignidade da Mulher, o Papa João Paulo II escreveu sobre o papel
fundamental das mulheres na história do Cristianismo. Ele ressalta que as
religiosas católicas não fazem parte da hierarquia da Igreja, a qual possui
três graus que são: “os bispos, os padres e os diáconos”. Consta nesta
encíclica que há papéis femininos e masculinos na Igreja, uma divisão de
tarefas. As mulheres religiosas são consagradas a Deus, a diferença entre os
dois papéis está na função sacerdotal ministerial, que é destinada apenas aos
homens. O papa também afirma que o paraíso não é destinado aos ministros, mas
antes aos santos, homens ou mulheres[5]. Com
isso, fica claro que a mulher não tem seu papel diminuído na visão do
imemorável papa João Paulo II.
Fiorenza
(1992) também menciona as mulheres que seguiram Jesus e defende a ideia de que
elas tiveram um papel relevante no movimento de Jesus. Para ela, esse movimento
histórico possuiu uma alta significação para os primórdios do cristianismo,
sendo responsáveis pela sua expansão.
Nas mensagens
apostólicas paulinas, encontravam-se menção a várias mulheres. As referências
às mulheres que apareceram na literatura paulina e pós-paulinas, indicam que
foram patronas ricas do movimento missionário cristão e que ocuparam lugares
elevados no trabalho de evangelização. Eram mulheres das comunidades cristãs da
Galácia, de Jerusalém e de Antioquia (FIORENZA,1992, p. 193).
A autora defende a ideia de
que as mulheres foram instrumentos para continuar o movimento iniciado por
Jesus e que lá estiveram envolvidas na expansão desse em direção aos gentios
das regiões adjacentes.
De acordo com Alexandre
(1990, pp. 511-63) faz uma exposição sobre os discursos e as imagens das
mulheres existentes nos textos fundadores da tradição cristã. Para a autora, o
poder das mulheres, desde as origens até a vitória do Cristianismo deveu-se à
sua fé e à facilidade de comunicação. “Mais facilmente libertas dos
constrangimentos políticos e sociais, das tradições religiosas e culturais da
cidade antiga, as mulheres pareciam estar adiante dos homens da sua família”. A sua influência
doméstica contribuiu para a conversão dos seus parentes e desempenhou um papel
essencial na transmissão da fé.
Martinho Lutero em seu programa de
Reforma aconselhou que os príncipes alemães organizassem escolas públicas para
meninos e meninas. Nunca a educação formal de jovens garotas foi alvo de um
programa sugerido por um líder religioso. Martin Bucer, reformador da cidade
estado de Estrasburgo, elaborou um ousado plano eclesiástico em 1532, no qual
estava prevista a ordenação de mulheres para o diaconato.
João Calvino trocou correspondência
com várias mulheres e, entre vários assuntos de natureza pastoral, até mesmo
pontos teológicos foram debatidos. O mesmo Calvino escreveu na edição francesa
de sua obra magna, as Institutas, datada de 1541, livro IV, capítulo XV, o
seguinte pensamento: “E alguma vez vai chegar a hora em que seria melhor que a
mulher falasse do que se calasse”[6].
Para o reformador de Genebra, a
restrição paulina encontrada em apenas um texto das Escrituras para a ordenação
de mulheres ao oficialato não deveria ser vista como um dogma de fé, mas, sim,
como uma convenção cultural de uma determinada época.
Calvino influenciou inúmeras mulheres a desempenharem uma
função prática de pastoras, mesmo que não fossem ordenadas para tal. É bastante
interessante o relato da historiadora estadunidense Natalle Daves a respeito da
participação feminina:
Algumas
mulheres prisioneiras nas cadeias da França pregavam para grande consolo de
ambos os ouvintes, homens e mulheres. O nosso jurista, ex-calvinista, Florimond
de Raemond, deu vários exemplos, tanto de conventículos protestantes quanto de
serviços reformados regulares - até o fim de 1572 - de mulheres que, enquanto
esperavam a chegada de um pregador, subiam ao púlpito e liam a Bíblia. Uma
teóloga até travou discussão pública com seu pastor. Finalmente, em algumas igrejas
reformadas no sudoeste de Paris, numa área em que tecelões e mulheres tinham
sido convertidos anteriormente, irrompeu um movimento para que leigos
pregassem. Isto permitiria que ambos, mulheres e homens sem instrução, se
levantassem na igreja e falassem sobre as coisas santas[7].
Dentro da esfera calvinista, não pode-se nos esquecer do
nome da rainha de Navarra, Jeane d´Albret. Sem fazer uso da violência ou
perseguição religiosa, Jeane estabeleceu oficialmente a fé reformada na região
de Bearn, organizando a igreja segundo os moldes genebrinos. Sua influência era
sentida tanto em assuntos burocráticos, como nos aspectos teológicos.
Portanto, constatou-se também que Jesus teve a ousadia de incluir
mulheres entre os seus seguidores, as quais o acompanhavam; algumas haviam sido
curadas por ele (Lc. 8: 1-3). Tais mulheres seguiam-no por duas razões
principais: primeiro, eram mulheres que foram curadas por
Jesus, e em sinal de gratidão o seguiam para ajudá-lo em sua caminhada, pois
eram mulheres ricas, como exemplo, temos Joana, mulher de Cuza, procurador de
Herodes.
O segundo motivo destas mulheres
seguirem Jesus, é que a situação da mulher naqueles tempos era de grande
humilhação, inferioridade e discriminação por parte dos homens, não
havendo nenhuma consideração de igualdade entre marido e mulher, muito pelo
contrário a mulher servia apenas para procriar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com a
análise realizada, constatou-se que foram muitos os empecilhos para a mulher
legitimar sua participação na história, em especial, no início do Cristianismo,
desde os costumes, preconceitos, comportamentos e atitudes culturais, que dizem
respeito à mulher e seu papel na sociedade, na família e na Igreja, que foram
sacralizados, impedindo o surgimento de uma nova consciência. Porém, esses
empecilhos foram vencidos e hoje já se pode discutir e destacar a importância
do papel na história do Cristianismo.
E Jesus, como era contra todo tipo de
discriminação e preconceito, defendia a igualdade da mulher em relação ao seu
marido. Mais uma motivo de gratidão daquelas mulheres para seguir o Mestre e o
ajudar em sua caminhada. Assim, O grupinho das discípulas de Jesus estava
ligado a ele por laços de afeto e gratidão.
É
importante ressaltar que, a tradição cristã sempre manteve a igualdade
espiritual entre mulheres e homens, inclusive na separação das funções e na não
consideração das mulheres como seres socialmente inferiores, ideia que
caracterizava algumas culturas antigas: as virtudes heroicas necessárias para a
santidade de um ser humano são as mesmas para as mulheres e para os homens,
embora eles realizem papéis diferentes. E o reconhecimento da dignidade humana
e espiritual das mulheres sempre esteve presente no pensamento da Igreja sobre
a família.
Todavia, com o passar do tempo, principalmente dentro do
cristianismo protestante, a mulher, mesmo no meio de uma cerrada cruzada
fundamentalista, tem conquistado seu espaço. No Brasil, denominações irmãs como
Exército da Salvação, Igreja do Evangelho Quadrangular, Episcopal Anglicana,
Metodista do Brasil, Evangélica de Confissão Luterana, Presbiteriana Unida e
uma infinidade de comunidades de pentecostais livres ordenaram mulheres aos
diferentes níveis de oficialato.
REFERÊNCIAS
ALEXANDRE, M. Do
Anúncio do Reino à Igreja - papéis, ministérios, poderes femininos. In PERROT,
Michelle e DUBY, Georges. História das
Mulheres no Ocidente. Trad. Maria Helena C. Coelho e Alberto Couto. Porto:
Edições Afrontamento, 1990.
AQUINO,
Ítalo de Souza. Como escrever Artigos
Científicos – sem arrodeio e sem medo da ABNT. João Pessoa: Editora
Universitária (UFPB), 2007.
BÍBLIA
Sagrada. 9ª ed. Ave Maria, 1966.
BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada.
São Paulo: Loyola, 1989.
FIORENZA, E. S. As origens cristãs a partir da mulher: uma
nova hermenêutica. Trad João Rezende Costa. São Paulo: Edições Paulinas,
1992.
MATA, Sérgio da. História e Religião. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2010.
STANLEY, J. Grenz. Mulheres na Igreja. Ed. Candeia, 1998.
[1] Aluna especial da disciplina
História das religiões e manifestações culturais no Brasil, do Programa de
Pós-graduação em História da UFCG, ministrada pelo Profº. Dr. João Marcos
Leitão dos Santos. marildagabriela@yahoo.com.br.
[2] BÍBLIA Sagrada. 9ª ed. Ave Maria,
1966.
[4] Capacidade de falar línguas.
[5] http://pt.wikipedia.org/wiki/Feminismo,
Acesso em 09 de agosto de 2011.
[6] http://mais.uol.com.br/view/fhtaeq67a15x/a-mulher-e-o-cristianismo-um-passeio-pela-historia-0402336ED4C12326?types=A&.
Acesso em 15 de julho de 2011.
[7] http://mais.uol.com.br/view/fhtaeq67a15x/a-mulher-e-o-cristianismo-um-passeio-pela-historia-0402336ED4C12326?types=A&.
Acesso em 13 de julho de 2011.
Parabéns pela monografia. Há tempos esperava por novidades aqui neste espaço e agora compreendo que estavas laborando esta peça sem igual e de importantes conotações na história do cristianismo mundial.
ResponderExcluirAtt.
Rau Ferreira
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